Secom CONAFER
Depois de incluir o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) nas discussões sobre a tese inconstitucional do marco temporal, que acabou virando Projeto de Lei pelo Congresso, o que impede a demarcação de terras indígenas após a Constituição de 1988, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu adiar os trabalhos da audiência de conciliação sobre a demarcação de terras indígenas para 28 de fevereiro de 2025. As reuniões estavam previstas para terminar em 18 de dezembro. O PL instituindo o marco temporal foi aprovado pelo Congresso em dezembro de 2023, contrariando os princípios constitucionais que balizaram a decisão do STF que deu ganho de causa ao povo Xokleng, de José Boiteux-SC, contra o estado de Santa Catarina que pedia a reintegração de uma área indígena. Por 9×2, o STF, em setembro de 2023, já havia enterrado a ideia do marco temporal ao instituir uma jurisprudência favorável aos povos originários. A decisão do STF é questionada em quatro processos no próprio STF. Gilmar Mendes é o responsável por analisar essas ações
Após críticas do movimento indígena e sem avanços significativos, o debate sobre a demarcação de terras indígenas foi adiado para o ano que vem. Criada pelo ministro Gilmar Mendes, a câmara de conciliação, que foi prorrogada para fevereiro de 2025, reúne representantes da União, do Congresso Nacional, dos governos estaduais e municipais, da sociedade civil e das comunidades indígenas. O objetivo é buscar um entendimento entre as partes envolvidas nos processos de demarcação de terras indígenas no Brasil. A câmara tinha realizado seis reuniões, nas quais discutiu, entre outros temas, a possibilidade de encontrar novas fontes de financiamento para as indenizações relacionadas às demarcações de terras.
No mês de outubro deste ano, depois que o ministro Gilmar Mendes pediu, o MPI anunciou cinco representantes para dar continuidade à comissão de conciliação. Mas as lideranças indígenas criticaram essas indicações, o que resultou na decisão da Articulação dos Povos Indígenas (Apib) de se retirar da mesa de conciliação. Após a Apib deixar a conciliação, Mendes manteve as discussões mesmo sem a presença dos indígenas. Segundo o ministro, “nenhuma parte envolvida na discussão pode paralisar o andamento dos trabalhos”.
Pouco tempo depois, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), incluiu o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) nas discussões sobre demarcações de terras indígenas. O MDA tem expertise técnica sobre questões agrárias e de reassentamento, o que é importante para ajudar a encontrar soluções justas em processos de demarcação de terras indígenas. Sua presença na mesa de conciliação pode garantir que sejam levadas em consideração a proteção das comunidades originárias e dos seus territórios ancestrais nesta luta contra o marco temporal. Além disso, o MDA pode atuar como um mediador entre as partes, ajudando a evitar conflitos e a promover um diálogo mais equilibrado, com foco no bem-estar das populações indígenas.
A inconstitucionalidade do marco temporal
Em 2023, o STF decidiu derrubar a tese do marco temporal com um placar de 9 a 2 em favor dos povos indígenas. Limitar os direitos dos povos indígenas à data da promulgação da Constituição de 88 é uma agressão aos povos originários e uma ilegalidade constitucional, por isso o STF não aceitou esta tese do marco temporal.
Em dezembro de 2023, o Congresso Nacional aprovou um Projeto de Lei que estabelece o marco temporal para a demarcação de terras indígenas, contrariando a decisão do STF tomada em setembro do mesmo ano. Nessa decisão, o STF deu ganho de causa ao povo Xokleng, de José Boiteux, em Santa Catarina, em um caso contra o Estado que queria retomar uma área indígena.
O STF, ao decidir a favor dos Xokleng, o STF reconheceu que as terras pertencem aos povos indígenas por sua história e ancestralidade, sem a necessidade de um marco temporal. Logo, a decisão do STF foi vista como uma derrota para a tese do marco temporal, pois deixou claro que os povos indígenas têm direito sobre as terras que tradicionalmente ocupam, independentemente da data de ocupação.
Apesar disso, o Congresso, ao aprovar o Projeto de Lei em dezembro, desconsiderou essa decisão do STF e tentou instituir o marco temporal por meio da legislação, o que ameaça os direitos territoriais dos povos indígenas. A Lei 14.701, sancionada em outubro de 2023, teve um veto parcial do presidente para se alinhar à decisão do STF, mas isso foi rejeitado pelo Congresso.
Em 22 de abril de 2024, o ministro Gilmar Mendes suspendeu os processos judiciais relacionados ao tema até que o STF tome uma decisão final. Contudo, essa suspensão não se aplica aos processos administrativos de demarcação de terras indígenas. A tensão entre os direitos indígenas e os proprietários de terras ainda é um assunto delicado e muito debatido no país.
De acordo com o próprio ministro Gilmar Mendes, a principal preocupação não seria a existência de um marco temporal, mas a criação de garantias jurídicas, como a rapidez na solução do processo, a saída dos ocupantes apenas após a indenização e o pagamento de valores compatíveis com o mercado. As discussões começaram em 5 de agosto e estavam previstas para durarem até o dia 18 de dezembro, mas, por decisão do ministro Mendes, a mesa de conciliação foi prorrogada para fevereiro de 2025.
Isso demonstra mais uma vez a inconsistência de uma tese discutida há anos, e que já deveria ter sido encerrada com a definição do STF em 2023. Este processo moroso prejudica diretamente os indígenas brasileiros que clamam por suas terras originárias e de direito, territórios ancestrais ocupados há muito tempo antes de 1500, quando os colonizadores chegaram ao Brasil. Este cenário moldado em incertezas que, ora beneficia os indígenas e ora ignora os povos originários no próprio debate sobre a demarcação de terras indígenas, continua causando angústia para aldeias de todo o país.