Reforma tributária: governo propõe que cesta básica, com isenção de impostos, tenha menos produtos

“Proposta está em projeto de lei que regulamenta a reforma tributária. Governo busca terminar regulamentação será feita entre 2024 e 2025 para ter início, em 2026, a transição dos atuais impostos para o modelo de impostos não cumulativos”

Alexandro Martello, Lais Carregosa, Thiago Resende/ G1 e TV Globo 

O governo propôs, juntamente com os estados, uma redução no número de produtos para a cesta básica nacional, que contará com isenção dos futuros impostos sobre o consumo (CBS, o imposto sobre valor agregado do governo federal, e o IBS dos estados e municípios). Em primeiro momento, 745 produtos teriam o benefício..

  • A cesta básica, por definição, pressupõe um conjunto mínimo de bens que deveria conter para atender às necessidades de uma família.
  • A depender da definição utilizada, o termo pode se referir apenas aos alimentos incluídos na rotina da família ou incluir outros itens, como produtos de limpeza e higiene pessoal.
  • Cesta básica: entenda o que dizem as leis sobre e o que pode mudar com a reforma tributária

“Coerentemente com esta diretriz, no Projeto, um dos princípios norteadores para a seleção dos alimentos a serem beneficiados por alíquotas favorecidas foi a priorização dos alimentos in natura ou minimamente processados e dos ingredientes culinários, seguindo-se as recomendações de alimentação saudável e nutricionalmente adequada do Guia Alimentar para a População Brasileira, do Ministério da Saúde”, diz a proposta do governo e dos estados.

Uma segunda diretriz da proposta, de acordo com o texto, foi a priorização de alimentos majoritariamente consumidos pelos mais pobres, com o propósito de assegurar que o máximo possível do benefício tributário seja apropriado pelas famílias de baixa renda. “Para embasar a seleção destes alimentos, foi construído um indicador que mensura a relação entre o quanto cada alimento pesa no orçamento de alimentos das famílias de baixa renda e o quanto pesa no orçamento de alimentos das demais famílias, a partir das informações da Pesquisa de Orçamentos Familiares do IBGE”, informa o documento.

E acrescentou ainda – “O terceiro e último dos princípios que norteou a seleção dos alimentos foi assegurar que os alimentos da atual Cesta Básica do PIS/Cofins tenham sua tributação reduzida, com exceção daqueles de consumo muito concentrado entre os mais ricos”, diz o texto.

Cesta básica atual

Atualmente, segundo relatório do Comitê de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas (CMAP), formado por vários ministérios, feito em 2021, as regras atuais contemplam a desoneração de 745 alimentos diferentes abrangidos pelas leis de desoneração de tributos federais. A cesta básica atual contém itens que não são necessariamente consumidos pela população de baixa renda, mas que são isentos de impostos federais. Tais como:

  • salmão;
  • bacalhau;
  • queijos como ricota e provolone;
  • fígado de pato e de ganso (“foie gras”);
  • óleo de coco;
  • cogumelos e trufas;
  • nozes, macadâmia e tâmaras.

Nova cesta básica nacional

Alíquota zero

A cesta básica com alíquota zero, proposta pelo governo, tem menos produtos. São eles:

  1. Arroz
  2. Leite fluido pasteurizado ou industrializado, na forma de ultrapasteurizado, leite em pó, integral, semidesnatado ou desnatado; e fórmulas infantis definidas por previsão legal específica;
  3. Manteiga
  4. Margarina
  5. Feijões
  6. Raízes e tubérculos
  7. Cocos
  8. Café
  9. Óleo de soja
  10. Farinha de mandioca
  11. Farinha, grumos e sêmolas, de milho, e grãos esmagados ou em flocos, de milho
  12. Farinha de trigo
  13. Açúcar
  14. Massas alimentícias
  15. Pão do tipo comum (contendo apenas farinha de cereais, fermento biológico, água e sal)

Desconto de 60% no valor dos impostos

  1. Carnes bovina, suína, ovina, caprina e de aves e produtos de origem animal (exceto Foies gras) e miudezas comestíveis de ovinos e caprinos
  2. Peixes e carnes de peixes (exceto salmonídeos, atuns; bacalhaus, hadoque, saithe e ovas e outros subprodutos)
  3. Crustáceos (exceto lagostas e lagostim)
  4. Leite fermentado, bebidas e compostos lácteos;
  5. Queijos tipo mozarela, minas, prato, queijo de coalho, ricota, requeijão, queijo provolone, queijo parmesão, queijo fresco não maturado e queijo do reino;
  6. Mel natural
  7. Mate
  8. Farinha, grumos e sêmolas, de cerais; grãos esmagados ou em flocos, de cereais
  9. Tapioca e seus sucedâneos
  10. Massas alimentícias
  11. Sal de mesa iodado
  12. Sucos naturais de fruta ou de produtos hortícolas sem adição de açúcar ou de outros edulcorantes e sem conservantes
  13. Polpas de frutas sem adição de açúcar ou de outros edulcorantes e sem conservantes

Associação de supermercados

A proposta do governo federal para a nova cesta básica, sem a cobrança de impostos, contraria a sugestão da Associação Brasileira de Supermercados (Abras). A entidade divulgou uma proposta, no começo deste mês, que prevê uma desoneração para uma ampla gama de produtos – cerca de 600 itens (nomenclaturas comuns do Mercosul – NCMs).

Entre os produtos com imposto zero, a Abras propôs que fossem incluídos o foie gras (fígado gordo de pato ou ganso), o bacalhau, trufas (fungos subterrâneos, ingrediente caro usado em pratos e doces requintados) e lagostas.

Entenda a discussão

  • Ao desonerar a cesta básica, o governo abre mão de arrecadação. Isso agrava o rombo das contas públicas – que somou R$ 230 bilhões no ano passado. O governo busca zerar o déficit neste ano.
  • Segundo estimativa da Receita Federal, a desoneração da cesta básica custará R$ 39 bilhões aos cofres públicos em 2024.
  • Além da renúncia de fiscal, ou seja, do valor que o governo deixa de arrecadar, outra discussão é o impacto da cesta básica no tamanho do imposto que será cobrado sobre o consumo de outros produtos — a chamada alíquota geral.
  • Estimada, por enquanto, em cerca de 27,5% – entre as maiores do mundo -, a alíquota geral dos futuros IVAs (impostos sobre o consumo) pode ser ainda mais pressionada para cima se a lista dos produtos incluídos na cesta básica com alíquota zero for muito extensa.
  • Alguns estudos apontam que o uso do “cashback” (devolução dos impostos pagos na cesta básica) seria uma alternativa menos custosa e mais eficaz para beneficiar a camada mais pobre da população, favorecendo a redistribuição de renda.

Regulamentação da reforma tributária

Pontos importantes, como o fim da cumulatividade, a cobrança dos impostos no destino, simplificação e fim de distorções na economia (como passeio de notas fiscais e do imposto cobrado “por dentro”) já foram assegurados na PEC da reforma tributária – aprovada e promulgada no fim do ano passado pelo Legislativo.

Entretanto, vários temas sensíveis ficaram para o ano de 2024, pois o texto da PEC indica a necessidade de regulamentação de alguns assuntos por meio de projetos de lei. É o que o governo começou a enviar ao Legislativo nesta semana. Esse primeiro projeto de regulamentação da reforma tributária possui cerca de 300 páginas, 500 artigos e vários anexos. Além disso, também traz oito páginas tratando apenas da revogação de regras atuais que serão extintas no futuro.

Além desse projeto, disse ele, haverá outros dois:

  • um sobre a transição na distribuição da receita (para os estados e municípios) e com questões relativas a contencioso administrativo;
  • um para tratar das transferências de recursos aos fundos de desenvolvimento regional e de compensações de perdas dos estados.

O cronograma da Fazenda prevê que a regulamentação será feita entre 2024 e 2025. Com o término dessa fase, poderá ter início, em 2026, a transição dos atuais impostos para o modelo de Imposto sobre Valor Agregado (IVA) — com cobrança não cumulativa.

Pontos básicos

Pela proposta de emenda à Constituição (PEC), cinco tributos serão substituídos por dois Impostos sobre Valor Agregado (IVAs) — com legislação única, sendo um gerenciado pela União e outro com gestão compartilhada entre estados e municípios:

– Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS): com gestão federal, vai unificar IPI, PIS e Cofins;

– Imposto sobre Bens e Serviços (IBS): com gestão compartilhada estados e municípios, unificará ICMS (estadual) e ISS (municipal).

– Além da CBS federal e do IBS estadual e municipal, será cobrado um imposto seletivo (sobre produtos nocivos à saúde) e um IPI sobre produtos produzidos pela Zona Franca de Manaus — mas fora da região com benefício fiscal.

Estimativas apontam que os futuros impostos sobre o consumo, para manter a atual carga tributária – considerada elevada, somariam cerca de 27% – e estariam entre os maiores do mundo. A alíquota final dos impostos, porém, só será conhecida nos próximos anos — após a realização de um período de testes para “calibrar” o valor — necessário para manter a carga tributária atual.

Impacto na economia, valor agregado e cobrança no destino

O governo espera que, com a simplificação tributária, haja um aumento de produtividade e, consequentemente, redução de custos para consumidores e produtores, estimulando a economia. Analistas e o governo estimam que a reforma tributária sobre o consumo tem potencial para elevar o PIB potencial do Brasil em no mínimo 10% nas próximas décadas.

  • Com a implementação do IVA, os tributos passariam a ser não cumulativos. Isso significa que, ao longo da cadeia de produção, os impostos seriam pagos uma só vez por todos os participantes do processo.
  • Atualmente, cada etapa da cadeia paga os impostos individualmente, e eles vão se acumulando até o consumidor final.
  • Com o IVA, as empresas poderiam abater, no recolhimento do imposto, o valor pago anteriormente na cadeia produtiva. Só recolheriam o imposto incidente sobre o valor agregado ao produto final.
  • Outra mudança é que o tributo sobre o consumo (IVA) seria cobrado no “destino”, ou seja, no local onde os produtos são consumidos, e não mais onde eles são produzidos. Há um período de transição de cerca de 50 anos da cobrança na origem para o destino.
  • Isso contribuiria para combater a chamada “guerra fiscal”, nome dado a disputa entre os estados para que empresas se instalem em seus territórios. Para isso, intensificam a concessão de benefícios fiscais.