PEQUENOS GUERREIROS: morte de crianças indígenas aldeadas mostra a tragédia da saúde entre os povos originários

Wilson Ribeiro/Secom CONAFER

A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), em parceria com a organização Transparência Brasil, agência Fiquem Sabendo e a Fundação Ford, divulgou no dia 19 deste mês, informações relevantes a respeito da saúde indígena, principalmente crianças menores de cinco anos de idade. De acordo com os dados obtidos, apenas no período de 2018 a 2021, o Ministério da Saúde (MS) contabilizou 3.126 óbitos de crianças indígenas dessa idade, sendo 72% delas bebês com menos de um ano, o que torna a situação ainda mais grave. Ainda neste mês de janeiro, a epidemiologista Fátima Marinho, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da organização de saúde Vital Strategies, realizou um levantamento a respeito de crianças e covid-19 no Brasil, onde a doença foi responsável por mais de 3 mil óbitos infantis, desde o início da pandemia, em 2020. Deste total, 4,4% foram de crianças indígenas, um valor considerado elevado e alarmante, se considerarmos o tamanho da população indígena brasileira. A falta de transparência e a defasagem dos sistemas de informação, que levam até dois anos para realizar o registro destes dados, segundo informação da própria Secretaria Especial de Saúde Indígena, órgão ligado ao Ministério da Saúde (MS), torna ainda mais difícil a vida das futuras gerações indígenas.

O que agrava ainda mais a questão sanitária indígena no Brasil, é que estes números podem ser ainda mais dramáticos, pois os dados referem-se apenas às aldeias localizadas em TIs demarcadas e foram obtidos, segundo a revista Carta Capital, por meio da Lei de Acesso à Informação, via Secretaria Especial de Saúde Indígena, órgão diretamente ligado ao MS.

Levando-se em consideração o tempo de até dois anos para o lançamento dos dados no sistema, prazo declarado pela própria Secretaria do MS, além dos diversos territórios ainda sem demarcação e a quantidade de indígenas que transitam entre as cidades e comunidades existentes no país, essa estatística pode representar cerca de um terço da realidade sobre a saúde infantil dos povos originários.

A grave situação em que se encontram os indígenas, principalmente desde que o início da pandemia, provocou, além das mortes diretas causadas por doenças respiratórias, como pneumonia não especificada, diarreia e gastroenterite de origem infecciosa, a piora das condições econômicas desses povos, que vivem fundamentalmente da produção agrofamiliar e do artesanato. A falta de estrutura e acesso às políticas públicas específicas, que contemple suas reais necessidades, aliadas a perda de renda, precariedade das moradias, falta de melhores serviços públicos de saúde e saneamento básico, apenas fazem aumentar o número de óbitos de crianças indígenas.

A alta taxa de mortalidade entre as crianças indígenas compromete a existência desses povos, a preservação de sua tradição e cultura e a própria vida do planeta. Os indígenas desempenham um papel fundamental para a manutenção de toda a biodiversidade terrestre, pois possuem uma relação estreita com o meio ambiente, com o uso sustentável dos recursos naturais e seus territórios, contribuindo também para a redução do desmatamento e equilíbrio da situação climática no mundo.

Diante da importância crucial da existência dos povos originários, é lamentável que a qualidade dos serviços de saúde prestados aos indígenas esteja em patamar tão inferior ao restante da população. Se cuidar das crianças é pensar no futuro, cuidar das crianças indígenas, dando acesso à melhores condições de saúde para que possam crescer e se desenvolver de forma saudável, é garantir a existência do planeta e seus ecossistemas, com a possibilidade de transmissão das práticas e saberes, passados geração a geração, sobre o trabalho com a terra e manejo ecológico dos diversos recursos, com amor e respeito pela natureza.

A CONAFER se preocupa com a situação dos povos originários no país, e se solidariza com eles em sua luta, na busca de ações à proteção de suas vidas e acesso às políticas de saúde pública mais específicas. A Confederação, que conta hoje com milhares de associados indígenas, acredita que construir um país mais justo, solidário e desenvolvido socioeconomicamente, passa por assegurar a existência desses guardiões das florestas, protagonistas nas ações pelo equilíbrio climático global e regional. Atuar para que sejam cumpridas as obrigações constitucionais, leis e tratados internacionais que asseguram os direitos destes povos sobre seus territórios, é trabalhar pela saúde das crianças indígenas.