FUTURO AGROFAMILIAR: herdeiros de um campo em transformação, jovens agricultores devem semear a nova agricultura familiar; estudo da FGV aponta os caminhos

Secom CONAFER

Como sabemos, hoje a segurança alimentar do país depende quase que em sua totalidade da agricultura familiar. 77% dos estabelecimentos agrícolas do Brasil são agrofamiliares. Porém, a população rural está envelhecendo, enquanto muitos jovens seguem migrando para os grandes centros urbanos. No final da última década, pessoas com mais de 65 anos representavam 21,4% dos moradores de áreas rurais, sendo que uma década antes, eram 17,52%. Neste mesmo tempo, os mais jovens, com idade entre 25 anos e 35 anos, eram 9,48% do contingente, bem abaixo dos 13,56% do censo anterior. O grupo entre 35 e 45 anos de idade encolheu de 21,93% para 18,29%. Na faixa de 55 a 65 anos houve aumento de quatro pontos percentuais, passando de 20% para 24%. Em resumo: a agricultura familiar enfrenta um momento importante de reorganização social, em que novas pessoas do grupo familiar assumem as rédeas dos negócios, da inovação necessária em cada categoria, das modalidades de acesso ao crédito, das aplicações digitais na produção de baixo carbono, da nova agroecologia, do melhoramento genético, das ações de ESG, dos SAFs e toda a revolução verde que acontece no campo 4.0. Conscientes desta  missão, muitos jovens já estão liderando núcleos agrofamiliares. O desafio é dar a eles as melhores condições de educação e trabalho, e principalmente, fortalecer o seu espírito de pertencimento campesino

A juventude agrofamiliar está presente em todos os movimentos do campo. São jovens participantes de movimentos sociais, de grupos agroecológicos, nas cooperativas e organizações coletivas, na educação ambiental, nos ambientes de ensino, e também na busca por crescimento socioeconômico de toda a família e comunidades. Estes são os jovens que ficaram no campo, porque muitos saíram por falta de melhores condições, em busca de uma vida melhor nas maiores cidades.

Ocorre que o campo mudou. Hoje existem excelentes universidades e escolas no interior, o mundo digital transformou os negócios e a comercialização dos produtos, a comunicação e o transporte melhoraram substancialmente, e a visão do empreendedorismo rural faz muitos jovens repensar seu futuro. Pois, é perfeitamente possível hoje ter acesso a uma excelente qualidade de vida no meio rural, ter acesso ao mundo da modernidade e obter lucro em seus próprios empreendimentos, em sua própria terra. 

Os caminhos e soluções apontados pelo estudo do Centro de Estudos em Sustentabilidade da EAESP, da Fundação Getúlio Vargas (FGV)

Segundo este estudo, “entre as dificuldades enfrentadas pelos jovens para permanecer no campo, estão a falta de autonomia nos trabalhos da propriedade, a ausência de renda pelos serviços prestados à família, a invisibilidade e a não valorização do trabalho. Em um contexto de rápidas transformações em termos de mercados e de tecnologias, as habilidades exigidas para o fortalecimento da agricultura familiar vão além daquelas até hoje passadas de pai para filho, ou seja, desafiam as tradições. Faz-se necessário um papel gerencial, de identificação e conquista de mercados específicos, de modernização da produção, de articulação com políticas públicas e engajamento em espaços de participação social. 

“Aos jovens é atribuído grande parte do potencial de alavancar as oportunidades do campo com inovação, tornando o trabalho no campo mais eficiente e menos penoso. Além disso, o “fazer diferente” da juventude é capaz de dialogar com o desafio de diversificar as atividades desenvolvidas no campo, agregando valor aos cultivos agrícolas e possibilitando aumento e estabilidade na renda familiar”.

O estudo orienta que se deve “promover o princípio pedagógico da alternância, investindo recursos em escolas familiares agrícolas, casas familiares rurais, centros de formação e outras iniciativas educacionais adaptadas ao campo. Incluir no projeto pedagógico atividades que conectem a escola à comunidade, priorizando o engajamento de pais e familiares no processo educativo, como trabalhos em grupo para a construção de censos comunitários e diagnósticos agrícolas; assembléias, eventos, dias de campo nos quais a família toda participe. Aproximar escola e comunidade na construção do projeto pedagógico, para que os tempos e os espaços se organizem a partir das necessidades dos estudantes e do território. Fortalecer a agenda cultural em territórios rurais. Criar ou aprimorar espaços públicos que permitam uma rotina de interlocução da juventude com o poder público, garantindo a participação de mulheres e jovens agricultores: assembléias, conselhos, comitês ou correlatos. Incentivar a livre organização da juventude e das mulheres da agricultura familiar, especialmente para fins produtivos, como associações e cooperativas”.

Atração de jovens ao campo e sucessão rural

“Uma vida rural dinâmica cria um horizonte de possibilidades, não apenas para os jovens filhos de agricultores, como também para jovens urbanos que enxergam no campo um estilo de vida possível para a realização de seus projetos de vida. Sob essa perspectiva, as diretrizes a seguir apontam para a disseminação da educação no campo e para o resgate de espaços de cultura, esporte e lazer. Fomentam também a presença de jovens em grupos produtivos (cooperativas, associações) e fóruns públicos (conselhos municipais), a fim de que eles participem ativamente de processos decisórios, dando voz às suas demandas”.

Empreendedorismo e diversificação de renda

“A diversificação de renda nas propriedades rurais, já amplamente discutida na literatura sobre o tema, é um importante gatilho capaz de viabilizar a decisão dos jovens em permanecer no campo. Nesse sentido, as diretrizes a seguir buscam promover o papel de empresas e governos em despertar o potencial empreendedor dos jovens. De modo geral, as ações apresentadas a seguir buscam conectar a juventude a conteúdos de gestão e a iniciativas que inspirem um olhar para vocações locais. Mais do que o imaginário de “ter a grande ideia, nunca antes pensada” a premissa aqui adotada é a do empreendedorismo que articula interesses e competências e que reconhece potencialidades que estão ao entorno”.

“Robô para ajudar a agricultura familiar no período de plantio já deu prêmio para alunos do Ceará”

Juventude na agricultura: protagonismo na inovação e na conservação ambiental

“Ao usufruir de dados e informações para a tomada de decisão na produção agrícola, o potencial de geração de renda aumenta e a qualidade do trabalho na execução das atividades diárias também. Sob a premissa de que a juventude é uma janela para o “novo”, as diretrizes a seguir buscam incentivar que empresas e governos criem condições favoráveis para a conexão entre jovens, sustentabilidade e tecnologias. Elas sinalizam também o papel de articulação que cabe aos atores públicos e privados, a fim de conectar a juventude a práticas de produção responsáveis.”

Com informações do Centro de Estudos em Sustentabilidade da EAESP, Fundação Getúlio Vargas.