DIGNA DE OSCAR: Eunice Paiva do filme ‘Ainda estou aqui’ deixou legado na luta dos direitos indígenas

Secom CONAFER

A história de Eunice Paiva foi retratada no filme “Ainda estou aqui”, indicado em 3 categorias ao Oscar 2025: Melhor Filme, Melhor Filme Estrangeiro e Melhor Atriz, com Fernanda Torres. A obra tem como protagonista uma mulher brasileira que lutou pelos direitos humanos durante a ditadura militar e, também, se tornou especialista em direitos indígenas no país. Eunice Paiva era uma das poucas profissionais que atuava com demarcações de terras indígenas e contribuiu para a luta dos direitos dos povos originários com artigos e ONGs, além de ter ajudado na formulação do artigo 231 da Constituição Federal, que estabelece que os indígenas têm direito à posse permanente das terras que tradicionalmente ocupam.

Em 1983, a advogada Eunice Paiva, juntamente com a antropóloga Manuela Carneiro da Cunha, assinou o artigo “Defendam os Pataxós”, publicado na Folha de São Paulo e considerado um marco na luta indígena brasileira. Para a CONAFER que promove a defesa dos direitos indígenas, é importante destacar o legado deixado por Eunice Paiva: digno de uma estatueta pelos serviços prestados ao povo brasileiro

Interpretada por Fernanda Torres, a brasileira Eunice Paiva (1929-2018), que ganhou destaque internacional com o sucesso do filme, é frequentemente lembrada pela luta incansável pelo reconhecimento do assassinato de seu marido, o deputado federal Rubens Paiva, desaparecido e morto pela ditadura militar em 1971. Por outro lado, uma parte igualmente relevante da carreira de Eunice foi a atuação na defesa dos povos indígenas do Brasil.

Formada em direito após a prisão do esposo, Eunice se destacou profissionalmente no período em que o conhecimento sobre a legislação que garantia a posse das terras indígenas era escasso, e a Fundação Nacional do Índio, Funai, era controlada por militares e agia de forma hostil aos povos originários. Ela desempenhou um papel muito importante na criação de uma base legal e na articulação civil que, até hoje, continua a fortalecer a luta pelos direitos dos povos indígenas no país.

Eunice Paiva em março de 1988 – Foto: Silvio Correa/Agência O GLOBO

Em 1983, a advogada Eunice Paiva, juntamente com a antropóloga Manuela Carneiro da Cunha, assinou o artigo “Defendam os Pataxós”, publicado na Folha de São Paulo e considerado um marco na luta indígena brasileira. O artigo denunciou o risco que os Pataxó corriam devido à grilagem de terras e a invasão por parte de fazendeiros.

As autoras destacaram a importância da luta pela proteção do território Pataxó, ressaltando a necessidade de apoio das instituições para garantir a sobrevivência cultural e física do povo indígena. “É essencial que informe os índios sobre o andamento dos processos na Justiça, que os faça sentir que não estão abandonados, que lhes infunda confiança e um pouco mais de paciência, para que se evitem catástrofes. E que também negocie com os fazendeiros o acesso à água potável”, diz um trecho do artigo. 

Eunice foi uma das fundadoras do Instituto de Antropologia e Meio Ambiente (Iamá), uma organização não governamental que contribuiu para a criação de projetos nas áreas de saúde, educação e política voltados para os povos indígenas

Antes disso, durante a ditadura, Eunice integrou a Comissão Pró-Índio de São Paulo, um grupo criado por antropólogos em 1978 como resposta à tentativa do governo militar de modificar a legislação. O objetivo do governo era dividir os indígenas em dois grupos: os que ainda seguiam suas “tradições” e, portanto, precisavam da “tutela” do Estado, e os que já estavam “emancipados” por terem se “aculturado”. Mas esse plano era uma tentativa de tirar o direito das terras e riquezas dos indígenas “emancipados”, que não seriam mais reconhecidos como parte dos povos originários.

O trabalho realizado pela Comissão Pró-Índio deixou uma base importante tanto para a pesquisa acadêmica sobre os povos indígenas quanto para a formulação jurídica dos artigos da Constituição de 1988, principalmente o artigo 231, que reconheceu os direitos territoriais dos povos indígenas e garantiu sua proteção constitucional. Esse artigo assegura aos indígenas o direito às terras que tradicionalmente ocupam, além de garantir a sua participação nas decisões que envolvem seu território e modos de vida.

Eunice Paiva (com roupa azul e óculos escuros) com ativistas e indígenas durante seu trabalho como advogada – Foto: Privat

Eunice Paiva foi uma das responsáveis por fortalecer a luta dos povos originários e deixou o legado da defesa dos direitos indígenas. Ao apoiar as comunidades indígenas, de forma permanente, a CONAFER, por meio da  Secretaria Nacional de Povos, Comunidades Tradicionais e Política Social, a SEPOCS, reforça esta herança com ações sociais e educativas nas aldeias, com debates que conscientizam os indígenas sobre os seus direitos e apoio jurídico como associados agrofamiliares. Além disso, a Confederação defende o marco ancestral contra a inconstitucionalidade do marco temporal, promovendo as causas indígenas por meio de reportagens, publicadas no site e no YouTube TV CONAFER.

A SEPOCS em parceria com a Organização Nacional dos Direitos Humanos oferece um curso para indígenas interessados em se capacitar para atuar como agente de Direitos Humanos. Estes profissionais atuam na defesa dos direitos territoriais indígenas, assegurando que as comunidades possam exercer sua autonomia e proteger seus modos de vida tradicionais.

Os agentes de direitos humanos ajudam a denunciar abusos cometidos contra os indígenas, como invasões de terras, trabalho escravo, violência policial e desrespeito a suas línguas e culturas. Também são essenciais na mediação entre as comunidades indígenas e o Estado, buscando garantir o cumprimento dos direitos reconhecidos pela Constituição. A ideia é que, neste ano, o curso seja ofertado na aldeia Imbiruçu, em Minas Gerais. 

O trabalho dos agentes de direitos humanos é especialmente importante para os povos indígenas, que frequentemente enfrentam discriminação e violência

A luta de Eunice Paiva na defesa dos indígenas e o compromisso da CONAFER em apoiar as aldeias de todo o país estão conectados aos mesmos objetivos: fortalecer a autonomia dos povos originários, a luta pelo direito à demarcação das terras indígenas e garantir uma vida digna nas comunidades tradicionais. A Confederação, ao atender mais de 114 mil famílias indígenas, em todas as regiões do Brasil, só pode reconhecer em Eunice Paiva a vitória do seu próprio prêmio de excelência como heroína dos povos originários.