Advogado Bruno Dourado explica “a obrigação do município em indenizar os munícipes pelos danos causados pelas enchentes”

a ocorrência das chuvas e suas respectivas consequências não podem ser contadas como imprevisível. Sua responsabilidade é objetiva (sem necessidade de prova de culpa), nos termos do artigo 37, parágrafo 6º da Constituição Federal, cabendo a todos os cidadãos que sentirem prejudicados, pelos atos omissivos (omissão) e comissivos (ação) praticados pelo Poder Público (Administração Pública), busquem o ressarcimento dos danos sofridos (sejam eles materiais, sejam eles morais”

Artigo

Infelizmente o período de chuvas em Andradina/SP está trazendo vários incidentes, no mínimo lamentáveis, segundo informações de diversos órgãos de imprensa e da Defesa Civil, e até mesmo por informações apresentadas em tempo real pelo Ilustre Vereador Hugo Zamboni, que vem cobrando o poder público dia após dia para que o problema seja resolvido, já ocorreram 03 enchentes entre novembro de 2021 e janeiro de 2022, ocasionando diversos danos sanitários e prejuízos financeiros para os moradores da cidade.

Além dos dados acima, que buscam ilustrar o cenário depois das chuvas, podemos citar como exemplos dos danos provocados, a contaminação por produtos tóxicos, contatos com agentes patológicos que provocam doenças, interrupção da atividade econômica das áreas inundadas, perda de utensílios domésticos, até do próprio vestuário e ainda todo o trauma que pode persistir junto aos atingidos sobreviventes, face a ação das águas.

De modo geral, enchentes podem ocorrer por causas naturais e/ou causas humanas. A causa natural se dá pelo período de chuvas e pela cheia dos rios. Já a causa humana se dá pela interferência do homem no meio ambiente por diversos fatores como a falta de planejamento urbano, descarte indevido de lixo, etc.

O período de chuva e a cheia dos rios são eventos naturais do clima que não podem ser impedidos, no entanto, podem ser previstos. Dessa forma cabe ao Estado analisar e identificar os possíveis danos que serão causados, bem como tomar as medidas necessárias para evitar que ocorram.

Mas por que o Estado tem essa obrigação?

O Estado é obrigado a garantir os Direitos Sociais da população, bem como o acesso ao Saneamento Básico, o artigo 3º, inciso I, alínea d, da Lei nº 11.445/2007, em seu, define o dever estatal e também deixa claro o que é o Saneamento Básico: Artigo 3º – “Para os efeitos desta Lei, considera-se:     I – saneamento básico: conjunto de serviços, infra-estruturas e instalações operacionais de: (…)     d) drenagem e manejo das águas pluviais, limpeza e fiscalização preventiva das respectivas redes urbanas: conjunto de atividades, infraestruturas e instalações operacionais de drenagem urbana de águas pluviais, de transporte, detenção ou retenção para o amortecimento de vazões de cheias, tratamento e disposição final das águas pluviais drenadas nas áreas urbanas”.

Dessa forma, compete a Administração Pública tomar as medidas que forem necessárias afim de prevenir os eventos da natureza que causam danos direto a terceiros. Se o Estado puder evitar algum evento danoso e mesmo assim permanecer inerte, haverá omissão e, portanto, o dever de indenizar os danos causados pela negligência estatal.

Não há que se falar em força maior, por eventos da natureza, como excludente de ilicitude, posto que devem ser considerados os danos inevitáveis que levam em conta as ações preventivas do Estado, ou seja, o dano que poderia ser evitado por meio da ação efetiva na investidura dos esforços financeiros e fiscalizadores de obras.

Compete ao Estado planejar as medidas necessárias afim de evitar danos que poderiam ser causados. Nesse mesmo sentido o Desembargador Reinaldo Miluzzi, na Apelação com Revisão nº 8054465200 de 2008, proferiu o seguinte voto: “Está bem evidenciado nos autos que o Poder Público deixou de fazer investimentos necessários à solução dos alagamentos na região. De outro lado, impende considerar que a essência da culpa está na previsibilidade da ocorrência do evento danoso. Ficou comprovado que fato similar ocorreu em Ribeirão Preto, em 27 de fevereiro de 1999, ou seja, três anos antes, causando prejuízo à população ribeirinha do córrego Ribeirão Preto, sobrevindo ações de munícipes que pretendiam indenização por isso. (…) Por conseguinte, providências deveriam ter sido tomadas para sanar o problema, como, por exemplo, ampliação da capacidade de vazão, captação das águas pluviais, barragens de contenção, além da simples limpeza das margens, mas nada se fez. Até porque, como anotou o MM, Juiz, escudado na prova oral produzida, a Municipalidade, após a ocorrência desses fatos, realizou a construção de uma represa, solucionando o problema, visto que não se tem notícia de outras enchentes de grandes proporções. Por esta razão, não aproveita à ré/apelante a alegação de que elevados foram os índices pluviométricos naquele dia, que indicam a intensidade das chuvas e, assim, a ocorrência de caso fortuito”.

Em decisões recentes, o Tribunal de Justiça de São Paulo demonstrou continuar favorável a tese:

    DIREITO PÚBLICO – APELAÇÃO DE AMBAS AS PARTES – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E MATERIAL – ENCHENTE DECORRENTE DE ÁGUAS PLUVIAIS QUE ALAGARAM RESIDÊNCIA DA AUTORA, CAUSANDO-LHE PREJUÍZOS – NEXO CAUSAL ESTABELECIDO – OMISSÃO DO MUNICÍPIO RECONHECIDA, ANTE A INEXISTÊNCIA DE SISTEMA PÚBLICO DE CAPTAÇÃO DE ÁGUA DA CHUVA NO LOCAL – AUSENTE EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE – REPARAÇÃO MATERIAL E EXTRAPATRIMONIAL DEVIDA PELA MUNICIPALIDADE, RESPONSÁVEL PELA INSTALAÇÃO DA INFRAESTRUTURA LOCAL – Flagrante a omissão da Municipalidade na prestação do serviço de escoamento de águas pluviais, dando causa aos danos sofridos pela autora em decorrência de enchente em local sabidamente sujeito àquelas ocorrências, sem que medidas preventivas eficazes tenham sido executadas pela Administração Pública – Ausente qualquer excludente de responsabilidade, não podendo ser considerada a alegada intensidade da chuva, sem comprovação dessa circunstância – Reconhecido o nexo de causalidade, deve responder pela reparação moral e material decorrente de seu comportamento danoso (…). (TJ-SP – AC: 00011334520128260491 SP 0001133-45.2012.8.26.0491, Relator: Antonio Tadeu Ottoni, Data de Julgamento: 08/05/2019, 13ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 09/05/2019)

    RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – MUNICÍPIO DE CATANDUVA – INUNDAÇÃO DA RESIDÊNCIA DOS AUTORES, EM RAZÃO DO TRANSBORDAMENTO DO CÓRREGO BARRO PRETO – OMISSÃO DA ADMINISTRAÇÃO QUANTO À REALIZAÇÃO DE OBRAS NECESSÁRIAS À SOLUÇÃO DO PROBLEMA DA REGIÃO, EXPOSTA ANUALMENTE ÀS ENCHENTES – DEVER DE INDENIZAR DECORRENTE DA FALTA DE SERVIÇO PÚBLICO – REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO – URGÊNCIA QUE FUNDAMENTA A DETERMINAÇÃO JUDICIAL NO SENTIDO DE QUE A MUNICIPALIDADE DEVE PROVIDENCIAR LOCAÇÃO DE IMÓVEL PARA OS AUTORES ATÉ A CONCLUSÃO DO PROJETO HABITACIONAL – SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA REFORMADA EM PARTE – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJ-SP – APL: 10084703920168260132 SP 1008470-39.2016.8.26.0132, Relator: Paulo Galizia, Data de Julgamento: 03/06/2019, 10ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 04/06/2019)

Portanto, a responsabilidade estatal se baseia na Teoria Subjetiva ou Teoria da Culpa Anônima, onde os danos causados decorrem da omissão do Estado em tomar providências, onde a falta de obras que razoavelmente seriam exigíveis, ou de providências que seriam possíveis, o socorro da Administração pela previsibilidade ou recorrência em que os eventos danosos ocorrem e havendo a omissão da Administração existe o dever de indenizar os danos morais e matérias causados.

Dr. Bruno Dourado é Pós-Graduado em Direito de Família e Sucessões na Instituição de ensino Complexo Jurídico Damásio de Jesus/SP e também Pós-Graduação em Ciências Penais pela PUC/MG. O advogado, Bruno Dourado é especialista em Direito de Família e Direito Trabalhista, atua majoritariamente na defesa das mulheres e dos trabalhadores, atuando também nas áreas de Direito Trabalhista, Direito de Família e Sucessões, Direito Bancário, Planos de Saúde e Direito do Consumidor. O escritório da Advocacia Bruno Dourado é na rua Acácio e Silva, 1757 – Stella Maris – Andradina – (18) 98181-2629 (fone e WhatsApp). Acesse também www.brunodouradoadvocacia.com.br.