“concursado em Andradina e Água Clara tem permissão para cumprir jornada aos finais de semana”
José Carlos Bossolan
Abrindo mão de portaria, o secretário municipal da Saúde de Andradina, João Leme por meio de ofício, autorizou um enfermeiro a cumprir sua jornada de 36h semanais aos finais de semana na UPA (Unidade de Pronto Atendimento). Segundo um outro servidor público, a autorização do secretário da saúde não havia sido feita para nenhum outro servidor do município.
O documento assinado em 22 de junho pelo secretário João Leme foi endereçado ao secretário de Administração, Edgar Dourado. O enfermeiro que não terá o nome revelado, é efetivo na Prefeitura de Andradina desde setembro de 2018, não tendo atingido a estabilidade no cargo, conforme o artigo 41 da Constituição Federal.
Além disso, o enfermeiro foi nomeado também em concurso público na Prefeitura de Água Clara/MS (distante 175 km de Andradina) em 21 de maio deste ano com carga horária de 40h semanais (das 7 às 11h e das 13 às 17h de segunda a sexta-feira), conforme consulta ao Portal Transparência daquele município.
Nossa reportagem entrou em contato com o servidor, onde o enfermeiro se manifestou dizendo que “Eu fiz o concurso. Minha carga horária é 36 horas. Eu faço 12 horas na sexta a noite, 12 sábado, 12 horas no domingo. Completando 36 horas por semana. Com intrajornada mínimo de 11 horas conforme CLT. Infelizmente os profissionais de enfermagem por ter salário baixo. Fazemos carga horária extensa para ter uma renda um pouco melhor. Hoje temos profissionais enfermagem que trabalha no UPA, Santa Casa e AME, fazendo em torno 36 horas seguidas. Vai ser publicado uma matéria de uma pessoa que está cumprindo sua carga horária em dois vínculos. Além de tudo quando teve a segunda onda de Covid, teve que abrir 20 leitos. Tivemos dificuldade de arrumar profissionais. Isso o secretário fez para não ter essa dificuldade enquanto tiver leitos abertos de Covid, podendo remanejar outros profissionais para CAC. Está tudo conforme a lei”.
Indagado pelo O Foco sobre as dificuldade encontradas por profissionais da saúde, especialmente neste período da pandemia, com enfermeiros sobrecarregados de serviços e com salários defasados, o Cofen (Conselho Federal de Enfermagem) por meio de sua assessoria de comunicação informou que -“Em resposta aos seus questionamentos, esclarecemos que, até o momento, não há regimento ou legislação específica para a categoria de Enfermagem, seguindo, portanto, o que rege a legislação trabalhista geral a todos os profissionais. Em alguns estados, há leis específicas de carga horária reduzida. Porém, em âmbito nacional, é uma demanda que tramita há mais de 20 anos no Congresso (PL 2295/2000. Sobre o repouso, também há um PL em tramitação que visa garantir o descanso digno aos profissionais de Enfermagem no âmbito federal (PL 4998/2016)”.
Segundo um funcionário da UPA ouvido por nossa reportagem na condição de anonimato, relatou que – “o profissional citado de fato está cumprindo a carga horária em Plantões aos finais de semana totalizando a carga de 36 horas sendo plantões noturnos com intervalos de 12 horas entre os mesmos. A liberação foi em caráter excepcional e temporário, as folgas dos demais profissionais normalmente ocorrem aos finais de semana, assim não há prejuízo ao serviço. No momento somente este profissional faz essa jornada, contudo ressalto que é em caráter temporário, não sendo rotina do serviço essa escala de serviço”.
O enfermeiro acrescentou dizendo que “seria também interesse, publicar e ajudar nossa profissão que a anos estamos lutando por um piso salaria que tramita no senado e carga horária de 30 horas semanais. Hoje a maioria dos profissionais de enfermagem tem que trabalhar em vários estabelecimentos para ter uma renda mínima. Chegando a ganhar muito pouco. Publicar também que teve vários profissionais de enfermagem de estão com depressão devido ao Covid e tudo que a profissão carrega, ano passado teve uma profissional que suicídio aqui em Andradina. Semana passada a enfermeira que trabalha no UPA e no presídio dormiu na estrada e teve acidente, pois trabalha no UPA noturno e no presídio diurno. O enfermeiro trabalha na Ilha Solteira durante o dia no 192 em Andradina a noite. Ele dormiu algumas vezes na estrada. Ele pediu exoneração da ilha mês passado devido dormir no carro. Essa é nossa profissão” – finalizou o enfermeiro.
A luta por melhorias salariais e jornada de trabalho reduzida é interesse de cada profissional, cabendo a categoria batalhar por seus direitos, não sendo dever da imprensa, e sim de associações ou sindicatos do ramo pedir mudança de legislação neste sentido específico, onde os projetos de leis tramitam na Câmara dos Deputados. Conforme o relatado pelo enfermeiro de fatos envolvendo alguns colegas, o mesmo ocupante dos dois cargos em municípios tão distantes, poderá tornar-se em uma das vítimas, pois o mesmo deixa o serviço no município sul-mato-grossense às 17h das sextas-feiras, e assume o plantão na UPA às 19h, em um período curto para percorrer um trajeto de quase 200 quilômetros até Andradina, em pista de mão única, tendo de fazer o caminho inverso para assumir sua função em Água Clara às 7h das segundas-feiras.
Em matéria publicada em 23 de junho pela assessoria de comunicação da Prefeitura, o enfermeiro foi recebido pelo prefeito Mário Celso Lopes e não estaria usando relógio de ponto. Segundo o Portal Transparência de Andradina, o município possui em seus quadros 14 enfermeiros efetivos para trabalhar nas unidades de saúde do município. Enquanto as categorias não se unem para reivindicar melhores condições salarias, jornadas de trabalho menores, os profissionais da saúde acabam sendo submetidos a jornadas de trabalho excessiva e se submetendo a certos riscos em busca de ganhos financeiros maiores.
A Prefeitura de Andradina tem pregado que faz “economia” de recursos financeiros, mas abre mão em contratar material humano por meio de concurso público, especialmente na área da saúde, e quem acaba sendo maior prejudicado como sempre é a população. João Leme foi o responsável pelo “calote” no cumprimento do TAC com a Santa Casa local, gerando bloqueio das contas do município por diversas vezes. Transformou em “puxadinho” da Covid-19 na garagem e calçada na UPA o local para atendimento de pacientes, atendendo os anseios do prefeito de Andradina em economizar e participou da criação de 20 leitos de UTI fictícios, que nunca existiram na prática no CAC.
Os fatos geraram indignações de vereadores, que também reclamaram de falta de profissionais de saúde, falta de medicamentos de uso contínuo, má qualidade de fraldas geriátricas, respiradores encaixotados, sem falar no inquérito instaurado pela Polícia Civil para apurar “fura fila” na aplicação de vacinas da Covid em Andradina, cuja investigação está em segredo de justiça.
Resta saber se o secretário de Saúde de Andradina também irá flexibilizar o cumprimento de jornada de trabalho, seguindo o interesse de cada servidor público municipal.